Epifania em 21 de maio de 2009

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Eu estava parado na rodoviária de Montenegro, esperando meu ônibus que partiria para Porto Alegre às 19h e 10min. Estavam acontecendo obras no pavimento da garagem onde os ônibus chegam. O barulho era ensurdecedor. Eu via as pessoas ao meu redor conversando, mas não ouvia um som do que elas diziam.

A cobertura da garagem era mais baixa que os postes de luz da rua, e bloqueava a luz deles, fazendo com que o ambiente fosse mais escuro do que geralmente era. Os homens da obra era apenas silhuetas. Um deles manejava uma pá. Outros dois, um nivelador de asfalto. Haviam mais três ou quatro montados em máquinas. A máquina de comprimir o asfalto era a que produzia grande parte do barulho, e a coisa que mais se movimentava no meio disso tudo.

Pensei em tirar o livro da mochila e ler, enquanto isso. Não conseguiria. O barulho era demais.
Eu havia dormido pouco, senti os olhos arderem. Olhei fixo para a máquina compressora que apontava um farol em minha direção.
Fechei os olhos.

***

De repente me vi acordando com 40 e poucos anos. A barba de mais de três meses pendurada na cara. Um quarto escuro, sem mobília além da cama. Apanhei um casaco, calcei as botas e fui pra rua.

– CORTE –

Um campo aberto. Noite. A luz elétrica havia sido DESABILITADA.

Pequenas casas (cabanas) como a minha se espalhavam atrás de mim. Eu saía da cabana como muitos outros, todos com a mesma aparência de cansaço que eu. Troquei olhares com alguns deles. Era quase como um exército de homens despertando, olhos inchados, mãos nos bolsos dos casacos.

O campo era extremamente amplo e plano. O horizonte escuro se expandia ao infinito. Eu sabia que participava do evento mais importante da história. À nossa frente, centenas de homens manejavam máquinas que liberavam faíscas, erguiam torres, gritavam e não eram ouvidos. O barulho das máquinas era o que havia nos cansado. Não sei se estava ali esperando meu turno ou apenas de testemunha.

O que eu sei é que aquilo não acontecia apenas onde eu podia presenciar. Acontecia no mundo todo. Era um evento global. No mundo todo, as pessoas participavam daquilo. Sem comunicação. Sem entusiasmo festivo. Sem nenhum tipo de enfeite. Era apenas o que era.

As máquinas atingiam um ritmo cada vez mais rápido.

As pessoas ao meu redor se aproximavam cada vez.

E de repente UM CLARÃO…

E eu tinha certeza que o mundo tinha acabado.

***

Abri os olhos novamente. A máquina compressora apontava o farol diretamente no meu rosto. Meus pés voltaram a pesar. Minhas mãos começaram a tremer de leve. A respiração foi suavemente voltando ao normal. Dez minutos depois, embarquei no ônibus.

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